(créditos deste post vão aos meus queridos rabino Marcelo Borer e Profª Dra. Jane Glassman. Postado originalmente em http://www.riototal.com.br/comunidade-judaica)
A gripe suína no Talmud
A gripe suína é conhecida há muito tempo, como sugere o texto do Talmud Bavli, Tratado Taanit, página 21 coluna b:
“Rabi Iehuda[1] foi informado sobre uma peste entre os suínos. Ele decretou um jejum[2]. O raciocínio de Rav Iehuda é que uma peste numa espécie pode se espalhar para outras? (A Guemará conclui:) O trato digestivo de um porco se assemelha[3] ao do ser humano[4].”
O comentário de Tossafot é um pouco diferente: Rabi Iehudá achava que a doença passaria dos porcos aos não-judeus, e destes aos judeus.
Meiri (comentário do século XIII sobre o Talmud) acrescenta que como tanto porcos quanto seres humanos carecem de rúmen[5], havia razão em temer que epidemias que afetem porcos também possam afetar seres humanos.
Como vemos, o Talmud ainda é uma caixa de surpresas...
Notas
[1] Rabi Iehudá bar Iehezkel foi um dos mais importantes discípulos do Rav (Aba Aricha), que inclusive o designou como professor pessoal de seu filho, Rabi Chia. Sempre que o Rav fazia uma viagem em prol da comunidade, levava consigo Rabi Iehuda, para discutir com ele aspectos profundos da Torá. Rabi Iehudá também possuía uma memória brilhante. Após a morte do Rav, foi estudar em Nehardea, com Samuel. Ele fundou a Academia de Pumpedita. Exarou centenas de leis do Talmud, em nome de seus mestres.
[3] Pois ambos não possuem o rúmen, estômago dos ruminantes.
[4] Indicando que uma ameaça à saúde do animal e também uma ameaça à saúde do homem e este era o temor de Rav Iehuda.
[5] Primeiro estômago dos ruminantes.
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obs do Theo:
1 - Rav Yehudá pertence à segunda geração dos sábios da Mishná, ou seja, sua atuação se dá aproximadamente na época de 250 a 290 e.c. (século III da era comum!!!!)
2 - A Guemará, série de comentários posteriores à Mishná, data aproximadamente do ano de 500 (ou 550) da era comum (século VI!!!!!! Uns 1500 anos atrás!!!!)
3 - Somente na década de 1970 é que os cientistas descobriram as inúmeras semelhanças entre o organismo suino e o humano: tamanho do coração, trato digestivo, temperatura média corpórea, tempo de decomposição após a morte, entre muitas outras semelhanças. Nesta época são feitos os primeiros implantes de válvulas cardíacas suínas em humanos, e hoje em dia cogita-se até testes de transplantes de coração de suínos para seres humanos. (Quem assiste CSI já viu Gil Grissom utilizar suínos mortos para estabelecer - através do estado de decomposição - o tempo transcorrido desde o assassinato investigado até o momento do encontro do corpo). Os nossos sábios de abençoada memória (chachamêinu zichronám livrachá) já sabiam das semelhanças MUUUUUUITO tempo antes dos anos 70.
E sempre tem quem pergunta porque nos referimos a eles como 'sábios'. Cada vez que eu estudo, mais me convenço de que os caras sabiam o que estavam falando. E quando alguma coisa parece muito absurda aos nossos olhos hoje... talvez apenas tenhamos perdido aquele contexto, tenhamos deixado de ver com aqueles olhos. Outras, podem nunca ter feito sentido e passarem a ser impressionantes em tempos futuros - como esta passagem, que pode ter passado desapercebida durante séculos, mas que demonstra que o conhecimento daqueles homens (e também mulheres, como Brúria - esposa do Rabi Meir) estava anos-luz à frente do nosso.
Um comentário:
Theo, descobri o seu blog no Estudos Judaicos e resolvi retomar o contato. Embora minha área seja a Psicanálise, nunca me afastei das questões judáicas. Fui professor de hebraico e de história judaica (em volta do ano 1970). Já nos comunicamos uma vez sobre o problema da transliteração, e apreciei muito as suas observações. Resolvi escrever só para retomar o contato.
Um grande abraço.
Davy Bogomoletz.
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